Traduzindo Álbuns: O imaginário mundo folclórico de Taylor Swift

Há dois anos, sem aviso prévio ou lançamento de single para apresentar uma nova era, Taylor Swift retornou no ano da quarentena com “Folklore”, seu álbum mais aclamado e, sem dúvida, o mais diferente de seu repertório até então. O início deste álbum é magnífico, começando pelo fato de que ele não possui um vínculo real com a artista, mas sim histórias fictícias criadas por ela. Nós fomos convidados a embarcar nessa trajetória encantadora.

“The 1” fala sobre o que poderia ter sido em alguns momentos. A canção, embora não seja exatamente revolucionária por si só, apresenta um novo tipo de composição. As novas canções de Swift vêm de um lugar diferente de sua mente, são compostas a partir de um mundo mais imaginário e mostram a cantora investindo muito mais em uma vida não vivida, ao invés de explorar acontecimentos pontuais de sua própria vida.

E não é à toa que chamamos de universo, pois Taylor criou lugares, personagens e eventos que parecem tão realistas a ponto de nos vermos refletidos neles. Ela já havia recebido aclamação por sua habilidade fantástica na produção e composição, mas “Folklore” a elevou a um patamar ainda maior. Combinando perfeitamente com a estética cinzenta do álbum, não é exagero dizer que a obra não se trata de preto e branco, não há julgamentos de valor; o certo e o errado se misturam de forma fluida.

Em “Folklore”, Swift se transforma em diferentes personagens, que cometem erros, traem, amam, se apaixonam, esquecem e seguem em frente. A coleção de sentimentos, escritos de maneira mais poética e subjetiva, cria espaço para talvez o álbum mais humano de Swift. Os sentimentos em “Folklore”, ao contrário do estilo mais familiar da cantora até então, não são exclusivamente dela. São universais.

É verdade que Taylor Swift não se desvinculou totalmente dos temas que sempre a inspiraram, e eles ainda estão presentes aqui e ali, desde seu relacionamento atual até seus inimigos e até mesmo sua disputa com a antiga gravadora, que atualmente detém os direitos de seus primeiros álbuns. No entanto, quando a cantora reflete sobre esses assuntos em “Folklore”, o projeto adquire uma atmosfera mais melancólica e simbólica. Um exemplo marcante disso é “My Tears Ricochet”, uma letra que parece narrar seu próprio funeral, mas muito provavelmente também se refere aos chefes da Big Machine.

“Você usa as mesmas joias que eu te dei enquanto me enterra” é um dos trechos mais impactantes de “Folklore”. Essa frase evoca um sentido profundo de perda e traição, representando uma das partes mais memoráveis do álbum.

De fato, devido aos aprendizados demonstrados e às sombras presentes em “Folklore”, o oitavo álbum de Taylor Swift também soa de certa forma quase póstumo. É através desse distanciamento que a cantora encontra uma força como nenhuma outra e a expressa por meio da produção durante o isolamento social. Aqui, ela assume uma posição de observação, olhando para um mundo distante sem julgá-lo, mas admirando seu universo e sua alternância. Não é à toa que a incorporação de diferentes personalidades em um único álbum faz com que Swift flutue em suas interpretações: enquanto um sotaque inglês surge em trechos de “Cardigan”, sua voz reconhecida no country aparece em “Betty”.

Outro ponto evidente da evolução da cantora pode ser observado em suas músicas mais feministas. Enquanto “Lover” nos trouxe a excelente “The Man”, “Folklore” traz o discurso da liberdade feminina, frequentemente confundida com loucura, de forma mais sutil e abrangente. Swift reflete sobre essas questões ao recontar a história da socialite Rebekah Harkness em “The Last Great American Dynasty”, mas principalmente em “Mad Woman”, uma das melhores faixas do álbum.

É verdade que, em termos de sonoridade, é impossível analisar “Folklore” sem mencionar os nomes por trás de Taylor Swift no álbum. Seu produtor, Jack Antonoff, trouxe uma direção musical mais próxima à de Lana Del Rey, enquanto Aaron Dessner, do The National, provavelmente foi o maior responsável pela sonoridade completamente distinta de “Folklore” em relação à discografia anterior da artista. No entanto, embora as mudanças de estilo e arranjo sejam as mais evidentes e imediatamente perceptíveis em “Folklore”, a revolução de 2020 para Swift ocorre principalmente em suas letras.

As letras de “Folklore” representam um grande avanço para Taylor Swift. Ela mergulha em histórias mais complexas, utiliza metáforas e imagens poéticas de forma mais intensa, e explora temas mais amplos e universais. As letras do álbum são maduras, introspectivas e carregadas de emoção, demonstrando um amadurecimento significativo na escrita de Swift. Ela se aventura em territórios mais profundos e emocionais, transmitindo uma maior profundidade artística em suas composições.

É verdade que a sonoridade de “Folklore” está muito mais enraizada nas bases do indie alternativo ou electro folk, ao mesmo tempo em que não abandona completamente o pop. O álbum de Taylor Swift se afasta das músicas radiofônicas mais comerciais, e essa mudança é muito bem recebida. É irônico que “Folklore” tenha alcançado um sucesso estrondoso, superando recordes que a própria cantora não atingia há algum tempo. Ela alcançou o topo das paradas simultaneamente, tornando-se a primeira artista a conquistar esse feito, e “Cardigan” se tornou seu primeiro número 1 desde “Look What You Made Me Do”.

Esses marcos de sucesso são um testemunho do impacto que “Folklore” teve junto ao público, demonstrando a capacidade de Taylor Swift de se reinventar e cativar uma ampla audiência, mesmo com uma abordagem musical mais alternativa e introspectiva.

É verdade que Taylor Swift amadureceu como artista ao longo de sua carreira, o que é esperado e até mesmo desejável para qualquer artista em seu desenvolvimento pessoal e criativo. No entanto, a mudança que estamos testemunhando em sua carreira recente a torna não apenas uma compositora e letrista mais completa, mas também mais desafiadora e inventiva. Nesse sentido, ela segue os passos de artistas como Beyoncé, cujas decisões artísticas transcendem as tendências radiofônicas.

Essa nova fase na carreira de Taylor Swift é extremamente bem-vinda, pois não apenas torna o contexto atual do pop mais diversificado, mas também eleva uma estrela do gênero a uma compositora ainda mais eclética e intrigante. Ao explorar novos estilos musicais e experimentar abordagens artísticas diferentes, Swift amplia suas fronteiras criativas e mantém seu público engajado, sempre ansioso por suas próximas criações. Essa evolução constante é um testemunho da sua busca por desafiar e surpreender, criando um impacto duradouro na indústria musical.

NOTA: 10